Dia desses estava eu já com os cremes noturnos aplicados, de pijama, esperando meu namorado chegar em casa para uma sexta-feira perfeita; cozinhar alguma coisa e assistir um filminho. Fui surpreendida por uma amiga com dois ingressos para um show da banda britânica The Kooks, muito famosa em 2006/2007 quando eu era uma pequena jovem emo. Olhei pro lado e perguntei "bora?” e ele disse "bora".
Pegamos um carro de aplicativo, paramos na frente daquela fila de pessoas com camisetas de banda, ambulantes oferecendo ingressos. Entramos pela que nos cabia, e nos vimos ali, na pista vip do show, junto daquelas pessoas que com certeza eu teria esbarrado em alguma comunidade do orkut.
Ver shows de bandas que eu gostava quando adolescente me faz pensar na Jessica criança/adolescente que mora dentro de mim, que acorda comigo todos os dias mas nem sempre dá uma palavra. Na hora eu senti uma onda muito forte de empolgação, mistura de surpresa pelo presente e euforia por ver uma banda que eu nem imaginava ver. Não me entendam mal, senhores kooks, mas vocês não são os primeiro na fila de prioridade de shows que quero ver. Mas a euzinha de lápis de olho preto do passado ficou bem feliz, viu?
Chegando lá eu logo de cara senti um clima diferente dos outros shows que já fui na vida. Lembro de ter lido algum tweet de alguém comentando que a energia das pessoas nos shows estava diferente. Também pudera, dois anos fechados dentro de casa, não espere a mesma empolgação das pessoas como se nada tivesse acontecido (e ainda continua acontecendo). Foi legal, cantei músicas que ouvi muito no meu Mp3 de 2GB que cabiam poucas músicas que eu sempre colocava em rodízio, mas mesmo assim foi esquisito. Foi legal, mas foi estranho.
Sair para jantar, passear no parque, uma exposição, um show. Eu sou uma pessoa de gostos simples, do dia, sem muita muvuca, mas admito que show é um dos eventos que mais gosto de ir. Pra mim, sempre tem uma aura de pausa no tempo-espaço em que nada importa, que as músicas que estou ali ouvindo conversam comigo na minha própria história, se entrelaçando com os meus acontecimentos. Olho pro lado e vejo esse mesmo caminho passando pelo olhar apaixonado de algum fã, provavelmente pensando alguma coisa parecida. Shows num geral, pra mim, é um sentimento em uníssono, uma única voz de milhares de pessoas voltadas para um único foco, um momento especial.
O que mais me impressionou nessa volta para esse ambiente, foi perceber como as pessoas que além de assistirem o show pela tela do seu celular enquanto gravam sua música favorita, também ficaram rolando suas timelines enquanto o show acontecia. Me lembrou eu mesma almoçando assistindo algum vídeo no YouTube. Porém, ali, a pessoa tinha comprado um ingresso, vamos combinar, nada barato, para ler conversas antigas de WhatsApp, enquanto o vocalista gastava suas cordas vocais e condicionamento físico pulando de um lado para o outro. Tá, esse é o trabalho dele, mas passou pela minha cabeça o olhar dele para a plateia, que parecia tão desconectada e esquecida de onde estavam naquele momento. São tempos estranhos.
Acabou o show, as luzes se acenderam e pegamos nosso caminho pra casa. Vi pessoas sorrindo, outras comendo um lanche na barraquinha da frente da casa de shows. Voltei pensando em como eu não tinha planejado aquela noite e como tinha sido uma surpresa pra lá de bem vinda, porém, pensei também nos próximos eventos que iriam acontecer daqui pra frente. Será que ainda conseguiremos sentir todos os corações tocando ao mesmo tempo novamente?
The kooks, 20 de maio de 2022 em São Paulo - SP.
O que ando ouvindo e lendo
Semana passada terminei o livro "Ciranda de Pedra” da escritora Lygia Fagundes Telles, de 1954, que inclusive foi inspiração para duas novelas da Rede Globo. Tenho uma coisa meio mórbida (e sei que muitas pessoas são assim também) de consumir algo assim que alguém morre, e foi o caso de Lygia. Me arrependo de não ter lido antes, já que é um livro muito intrigante, a frente do seu tempo (e também um espelho da época, já que tem várias passagens racistas) e de uma escrita muito envolvente. Indico muito.
Também ouvi essa semana o disco de estréia dos Racionais, de 1990 - Holocausto Urbano, e novamente é esquisito ver como as coisas não mudam, o mundo é sempre o mesmo, só mudando a fachada.
Por hoje é só
Estou me organizando para passar por aqui (nem que seja rapidinho) uma vez por semana, porém a vida anda me engolindo. Mas, como estou aqui e você aí, se quiser conversar sobre a newsletter de hoje, é só responder esse e-mail.
Fiquem bem, usem máscara e até semana que vem!