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Morar no centro de São Paulo é lidar com a sujeira das calçadas, transeuntes que são uma mistura de trabalhadores, moradores da região e pessoas em situação de rua e também a falta de árvores.
Sempre que preciso passar por alguma calçada estreita aqui perto de casa, dou de cara com um poste, e percebi só recentemente que essas trombadas nunca acontecem com árvores. Se eu parar pra analisar a minha rua, deve ter uma a cada quarteirão.
Estranho prestar atenção nisso, na mesma semana que precisei ir para um bairro mais distante, mas que é considerado área nobre de São Paulo. Dentro do carro, passei por metrôs, pontos de ônibus, uma avenida principal e do nada, exatamente do nada, uma grande sombra se instala na minha frente: belas árvores cortadas, uma após a outra, alinhadas com gramado também bem cortados, com algumas flores espalhadas de forma discreta. Parei de novo e olhei para frente e para trás, enquanto era contida pelo cinto de segurança. Vi uma quantidade há muito tempo não vista de mini casinhas bem pintadas e cuidadas, sem nenhum prédio na mesma rua.
Parei, olhei, refleti sobre o caminho feito até aquele bairro e fiquei tentando pensar o porquê nos foi tirado o direito de ter árvores perto de casa.
Não culpo apenas a região mal cuidada onde moro. Lembrei também de quando morava em um bairro mais afastado, que uma das maiores reclamações era que o prefeito da época estava “plantando árvores demais”. De tão curiosa que estava, fui até o local para checar as mais recentes moradoras não quistas da região. Eram três ou quatro mudas magrinhas de pequenas plantas que ainda levariam um tempo pra crescer. Voltei na pessoa que havia me contado dizendo que não tinha visto nada demais. Logo ela respondeu que se ela sofresse um acidente com o próprio carro, com certeza aquelas árvores do canteiro atrapalhariam a vida dela de alguma forma.
As árvores hipotéticas atrapalhariam um acidente hipotético.
Na mesma época vivi mais um momento esquisito em relação a árvores. Morei em uma casa onde havia um limoeiro e uma aceroleira, que ficavam carregados no verão. Eu adorava a sensação de no meio de uma tarde de calor colher aquelas acerolas e fazer um suco bem geladinho. Percebida a minha empolgação com as frutas, um dia qualquer fui pega de surpresa pelos dois pés derrubados. Cortados na raiz, com sacos de cimento apoiados naquele toco que alguns dias atrás tinha me dado frutos tão gostosos.
Alguns meses depois, a árvore da frente da casa foi cortada pela mesma vizinha, dizendo que não suportava que os cachorros urinavam ali.
Eu não imaginava que árvores trariam o pior de mim. Naquele dia, cortei laços com a vizinha e fiquei muito indisposta de continuar naquele endereço.
O desconforto pessoal fez com que uma única pessoa destruísse três árvores num curto período de tempo.
Lembrei dessa história enquanto passava nessa mesma bela rua de belas árvores. Percebi que hoje, quem tem árvores por perto é quem vive melhor. Seja no interior com ar mais puro, seja quem mora na grande cidade, que para tê-las, é preciso pagar o seu aluguel, e porque não o aluguel das plantas.
Agora sem querer imagino árvores com bolsas de grife e echarpes de cashmere.
Para Ouvir
Temos episódio novo do chocolatinho com o Alberto Brandão, também conhecido nas ˜redes˜como Startup da Real. Queria falar sobre disciplina e acabamos falando de vida de uma forma muito mais profunda. Ouça e depois me conte o que achou!
Já no O Alvissareiro discutimos com o Hiago Vinicius sobre a vida noturna de São Paulo e como estamos nos distanciando de eventos sociais.
Por hoje é só
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Jess, na rua dos meus pais, lá na zona leste, começaram a plantar mudinhas magrinhas de árvores na calçada. As pessoas ficaram revoltadas (inclusive meu pai), porque "árvore atrapalha". Dá pra acreditar? Eu quis chorar!